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terça-feira, 30 de abril de 2013

OS ESTUDOS LITERÁRIOS SECUNDÁRIOS


http://sapereaudeon.blogspot.com.br/2010/10/busca-pela-sabedoria-na-grecia-antiga.html

O presente capítulo nos apresenta a como se dá a sucessão dos estudos literários. Um elemento importantíssimo é o conflito que há entre os professores desses níveis pelo fato de alguns se dedicarem ao ensino em mais de um nível:

A cada um dos três graus, primário, secundário e superior corresponde, para o ensino das letras, um mestre especializado: ao instrutor primária [...] sucede o "gramático" [...] e a este o retórico [...]. A distinção teórica esvaece-se, às vezes, de fato: sem falar nas regiões coloniais, onde o ensino não estava talvez organizado de maneira completa, podia acontecer que um mesmo professor tivesse interesse em atender duas clientelas: ao que parece, isto era normal em Rodes, a grande cidade universitária do século I a. C.: Aristodemo de Nisa, por exemplo, aí ensinava a retórica pela manhã e a gramática à tarde. (p. 251)

A principal queixa é dos retóricos para com os gramáticos:

Tal fenômeno cala freqüentemente como um abuso, como uma pretensão inaceitável por parte destes últimos; é, entretanto, inevitável. Observa-se isto também nos dias de hoje: vimos nosso ensino primário entufar-se de pretensões "encoclopédicas" à imitação do secundário; este, por sua vez, arrebanhou ao superior o programa de suas aulas científicas e os métodos filológicos de seu ensino literário. Constatamos algo de semelhante na época helenística e romana: os gramáticos terminaram por anexar uma parte do domínio próprio dos retores, e, talvez, por seu turno, o gramatista invadiu o terreno de seu colega secundário. (p. 251-252)
           
Trata-se de um fenômeno que parece ser característico do período helenístico:

Como se trata de um desenvolvimento contínuo, é difícil precisar e datar os diferentes estágios desta evolução (nossas fontes latinas permitem-nos constatar somente que a "usurpação" dos gramáticos sobre os retóricos era um fato consumado desde os meados do século I a. C.): eis por que também nossa análise dos estudos literários próprios do escalão secundário deve apresentar-se certa imprecisão quanto a seus limites. A duração desses estudos e a idade em que começam não podem ser fixados com precisão. (p. 252)

MARROU, Henri-Irenée. Os estudos literários secundários. In: ___. História da educação na antigüidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 251-274.

segunda-feira, 29 de abril de 2013

A INSTRUÇÃO PRIMÁRIA


http://cpantiguidade.wordpress.com/2009/09/02/violencia-contra-mestres-na-grecia-e-roma-antigas/

Esse capítulo não trás nenhuma novidade em relação ao capitulo referente a Escola primária, sobre a situação do professor. Aqui temos a relação de conteúdos trabalhados pelo mestre-escola: a leitura, o alfabeto, as sílabas, as palavras, textos e antologias, a recitação, a escrita e o cômputo. Além do programa de ensino há referências a como eram os livros, cadernos e tabuletas utilizadas por mestres e alunos. Por fim, há referência as violências utilizadas pelos mestres para com os alunos. 

MORROU, Henri-Irénée. A instrução primária. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 236-250.

domingo, 28 de abril de 2013

A ESCOLA PRIMÁRIA


http://maosabertassonhosasolta.blogspot.com.br/2010/05/violencia-contra-os-mestres-na-grecia-e.html

No período anterior aos sete anos a criança não recebe nenhum tipo de educação formal e/ou sistemática. É a partir dos sete anos que esta educação passa a se dar.

Preceptor ou pedagogo

Já não há mais a educação privada, porém, existe uma figura do meio privado que deve zelar pela educação dos jovens: o pedagogo

Notemos, entretanto, a persistência de um elemento privado: entre o número dos mestres que contribuem para a formação da infância figura o "pedagogo" [...] o servidor encarregado de acompanhar a criança nos trajetos quotidianos entre o domicílio e as escolas. Seu papel é em princípio modesto: é um simples escravo, encarregado de carregar a pequena ba­gagem de seu jovem amo, ou a lanterna que deve servir para iluminar o caminho, por vêzes a própria criança, se está fatigada (remeto o leitor às encantadoras terra­cotas que no-lo mostram em ação). (p. 126)

Essa personagem não tem por finalidade educar técnicamente, mas a educação moral é que constitui o objeto de seu trabalho:

Mas êste papel tinha também um aspecto moral: se se fazia acompanhar a criança, é que se tornava neces­sário protegê-Ia contra os perigos da rua, e sabe-se quais eram; o pedagogo exerce sôbre seu pupilo uma contínua vigilância, muitas vêzes sentida, com o tempo, à idade da adolescência, como uma insuportável tirania. Mui­to naturalmente, apesar de seu caráter servil e do pouco prestígio de que, muito freqüentemente, gozava, es­tende sua função além desta proteção negativa: ensina à criança as boas maneiras, forma seu caráter e sua moralidade. Embora à margem da instrução de ordem técnica que os diversos mestres ministram (e para a qual contribui freqüentemente na qualidade de repetidor, incumbido de ensinar as lições, etc.), é tôda a educação moral que está confiada ao "pedagogo", cujo papel perpetua assim, na burguesia helenística, o do "preceptor" dos heróis homéricos. [...] (p. 227)

Este se trata “de educador no sentido pleno (embora permaneça sempre distinto do "mestre" minis­trador de ciência).” (p. 227)

Difusão da escola primária

A língua reflete também a importância, doravante preponderante, que o ensino das letras tomou na edu­cação: quando se diz, absolutamente, "o mestre" [...] é o instrutor, o mestre-escola que ensina a ler [...] que se designa assim, e a "escola" sem mais nada [...] é o estabele­cimento onde êle ensina. (p. 227)

Os locais escolares

Podemos verificar que não há estrutura a disposição do “mestre”

Nada sabemos de bem preciso sôbre os locaís ocupa­dos pelas escolas primárias. Como há muito tempo en­tre nós, como aínda hoje em países muçulmanos, devia ser uma sala qualquer, que nada de especial predispunha para o uso escolar. Uma só peça teria sido suficiente: não parece estabelecido, como por vêzes se afirmou, ter sido precedida de uma sala de espera onde os peda­gogos permanecessem durante o tempo da aula: é mais provável que êles assistissem a esta, sentados à parte, como no-lo mostram já os vasos do quinto século. (p. 228)

Condições do mestre

As condições “profissionais” do mestre são também precárias em relação a sua condição social e econômica:

Aí ensina o mestre; êle é geralmente o único a assumir a responsabilidade de uma classe: na época pré-romana, não se vê aparecer freqüentemente "mes­tre-coadjuvante" [...] nem repetidores fornecidos pelos alunos grandes. Quanto ao próprio mestre, temos a surprêsa de descobrir quão pouco caso a sociedade antiga fazia desta função docente que a nossa considera, ou pretende considerar, com respeito e honra.

Quem eram esses mestres?

O ofício de mestre-escola permanece, durante tôda a Antigüidade, um ofício humilde, bastante desprezado, que serve para desacreditar aquêles como Ésquilo ou Epicuro, cujo pai foi constrangido a praticá-lo. Como o trabalho de instrutora ou de governanta na Inglaterra vitoriana, é a profissão típica para o homem de boa família que sofreu reveses da fortuna: exilados políticos, apátridas errantes "reduzidos pela miséria a ensinar", tiranos destronados, como outrora Dionísio de Sira­cusa. . .Lembremo-nos dos reis de Luciano que, nos infernos, despojados de sua fortuna, se viram forçados a tornar-se mercadores de salgados, mestres de primei­ras letras ou sarrafaçais: "Ou morreu, ou é instrutor em alguma parte", costumava dizer um cômico sôbre al­guém de quem não se tivesse notícias. (p. 229)

Por que êste desprêzo? De início, salvo o caso das cidades onde, como Mileto ou Teos, as escolas se torna­ram públicas e onde o mestre, eleito pela assembléia dos cidadãos, participa da dignidade de magistrado público, ser instrutor é um "ofício", no sentido comercial e servil da palavra: faz-se mister correr à clientela, fazê-Ia pagar-lhe, coisas estas tôdas desonrosas aos olhos dos aristocratas que seguiam sendo os gregos.. (p. 230)

E que condições econômicas viviam os “mestres”?

Ofício pago, e, o que é pior, mal pago: os documentos mais precisos a êsse respeito são as cartas epigráficas de Miletoe de Teos: a primeira fixa o salá­rio dos mestres de primeiras letras em quarenta drac­mas mensais, a segunda em quinhentas dracmas por ano, no ano normal (é proporcionalmente aumentado nos anos em que se anexa um mês intercalado: nos dois casos, êste salário é um pouco mais elevado que o de um obreiro qualificado, cujo sôldo, sabe-se, era normalmente de uma dracma por dia, mas não é bas­tante para representar uma elevação real do nível de vida.
Ainda era preciso estar seguro de ser regularmente pago. O caso de Teos e de Mileto é excepcional: aí, o salário dos mestres, assegurado pelas rendas de uma fundação, está inscrito no orçamento da cidade e é pago pelos tesoureiros municipais conformemente a um mi­nucioso estatuto. Alhures, por tôda parte, os mestres devem contar com as eventualidades da clientela parti­cular; em princípio, êles eram como os instrutores pú­blicos de Mileto e de Teos, pagos no fim de cada mês, mas os pais necessitados fazem-nos por vêzes esperar ­sem falar nos harpagões, como o de Teofrasto, que pro­cura economizar um mês dentre doze fazendo seu filho faltar à escola durante o mês de Antestérion, sob o pre­texto de que são muitos então os feriados e que os dias escolares restantes já não são tantos que mereçam a despesa. (p. 230)

Qual a qualificação necessária para ser ”mestre”? A qualificação tem influência em relação aos salários?

Mas sobretudo o ofício de instrutor não é conside­rado, porque no fundo não supõe qualificação especial. Em nenhuma parte trata-se de exigir dos mestres uma formação profissional análoga à que proporcionam nossas escolas normais atualmente: a lei escolar de Mileto, tão preciosa por sua minúcia, mostra-nos como se faziam as eleições para êsse cargo; não se exige do candidato nenhum título e os eleitores são simplesmente incumbi­dos de escolher, conscienciosamente, "os mais capazes de ocupar-se com as crianças". Não se exigia dos mestres, parece, nenhuma garantia, a não ser do ponto de vista moral, caráter, honorabilidade: tecnica­mente, quem quer que houvesse aprendido a ler era considerado capaz de por sua vez improvisar-se em mes­tre; bastava pôr em prática suas recordações de infância. (p. 230-1)

Mas nem tudo eram desgraças:

Eu, porém, não gostaria de deixar o leitor sob uma impressão forte demais: por mais mal pago que fôs­sem, os mestres de primeiras letras têm, em Mileto pelo menos, uma situação ligeiramente superior à dos seus colegas de ginástica, que recebem apenas trinta dracmas por mês. Por ser desacreditada, sua profissão, tão útil, não deixa de receber, aqui ou ali, estímulos oficiais: no terceiro século antes de Cristo, Lâmpsaco concede­-lhes a imunidade fiscal e Ptolomeu Filadelfo a isenção da gabela; enfim, certos monumentos atestam que seus antigos discípulos os cercavam por vêzes de um respeito repassado de gratidão, como o indica o epitáfio de um velho mestre de Rodes, falecido após cinqüenta e dois anos de magistério. (p. 231)

Escola e educação

A figura do mestre escola (gramatista) é como a do escriba instrutor:

O mestre de primeiras letras é encarregado de um setor especializado da instrução, provê tecnicamente a inteligência da criança, mas não é êle quem educa. O essencial da educação é a formação moral, a do caráter, do estilo de vida. O "mestre" está encarregado apenas de ensinar a ler, o que é muito menos importante. A associação, que nos parece hoje natural, da instrução primária e da formação moral é, entre nós, uma herança da Idade Média, ou melhor: da escola monástica, onde a um mesmo personagem coube promover a síntese de dois papéis bem distintos: o de instrutor e o de pai espiritual. Na Antigüidade, o mestre de pri­meiras letras é alguém muito apagado para que a família pense em confiar-lhe, como o faz tão freqüentemente hoje, a responsabilidade da educação. Se alguém, que não os pais, recebe esta missão, é decerto o pedagogo: um simples escravo, sem dúvida, mas que pelo menos pertence à casa e que, através do contato quotidiano, pelo exemplo se possível, em todo caso através dos preceitos e de uma vigilância atenta, contribui para a educação, e sobretudo para a educação moral, incomparavelmente superior às aulas puramente técnicas do "gramatista". (p. 232)


Aqui temos que analisar duas figuras distintas: o pedagogo e o “mestre-escola”.

O pedagogo é um escravo responsável pelo cuidado e pela formação moral da criança. Trata-se de uma pessoa de boa formação que por alguma circustância levou a escravidão, principalmente, ser tornado prisioneiro de guerra ou não poder saldar uma divida.

O “mestre-escola” é responsável pela educação técnica, a técnica da escrita e leitura. Esse não tem papel moral. Trata-se de um cidadão, também, passou por reveses na vida e acabau tendo que vender os seus serviços como ”mestre”.

Ambos não eram valorizados socialmente, um pela sua condição de escravo e o outro por ter que viver de trabalho pago (o que era visto com desprezo pela aristocracia).

MORROU, Henri-Irénée. A escola primária. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 224-235.

sábado, 27 de abril de 2013

A EDUCAÇÃO ARTÍSTICA


http://www.samuelcasal.com/blog/?m=200804

A educação artística grega era predominantemente uma educação musical, porém o desenho tinha o seu lugar e é exatamente pelo desenho que MARROU inicia sua exposição.

O DESENHO

Há registros sobre o ensino do desenho deste o século IV a.C. Aristóteles irá considerar o ensino do desenho como uma disciplina optativa e de uma forma geral é assim que o ensino de desenho será considerado pelos gregos, um disciplina secundária em relação ao ensino de música. Mesmo sendo relegada a segundo plano o ensino de desenho terá algum espaço na educação grega até pelo menos o século II a.C.

A MÚSICA INSTRUMENTAL: A LIRA

A lira era o instrumento musical predileto da época sendo que “a criança aprendia a tocar lira com um mestre especializado [...], diverso, salvo exceção, o mestre-escola com quem estudava as letras.” (p. 213)

Importante lembrar que a música também era considerada como parte das matemáticas.

CANTO ACOMPANHADO E CORAL

Era muito comum o canto acompanhar a execução da lira e de outros instrumentos, em especial os corais. Esses corais eram hora regidos por um profissional especializado, horas regido por um simples cidadão, dependendo da cidade e da época. Apesar disso tudo, o canto tem um papel secundário em relação a lira.

A DANÇA

A dança normalmente estava associada ao canto-coral. Assim como o canto coral não tinha um espaço definido na educação a dança também não o tem.

RETRAÇÃO DA MÚSICA NA CULTURA E NA EDUCAÇÃO

No período helenístico as artes musicais (instrumental, canto, dança, etc) vão perdendo espaço para os estudos literários. Esse espaço reduzido para o ensino de música pode ser visualizado na relação de professores contratados pela cidade de Teos:

Enquanto o regulamento prevê, para o conjunto das escolas, três professores de letras e dois de ginástica, um só mestre de música bastará. Sem dúvida ele é muito bem remunerado: seu salário anual é de 700 dracmas, ao passo que o dos seus colegas oscila entre 500 e 600; trata-se de um especialista, mas fica um pouco a margem.” (p. 219)
           
A citação anterior nos ajuda a visualizar algumas coisas a respeito desse profissional: ele é um especialista em música; ganham relativamente bem em relação a seus colegas de outras áreas, porém as vagas para este tipo de profissional são em menor número; o que confirma que seu trabalho não é considerado tão importante.

Um dos elementos que MARROU apresenta como sendo importante para essa retração é o refinamento das técnicas musicais, o que tira o ânimo daqueles que gostariam de estudar música com um caráter de cultura geral e não de profissionalização.

MARROU, Henri-Irénée. A educação artística. In:___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1971. p. 211-223.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

A EDUCAÇÃO FÍSICA


https://sites.google.com/site/historiaeducacaofisica/conteudos/atividade-fisica-na-grecia-antiga

Nosso interesse em relação a educação física consiste no fato desta se constituir em uma “escola” a parte e com um “professor” a parte:

Este ensino era confiado a um mestre especializado, que conserva o velho nome de predótriba [...]; era este muito mais do que um monitor de ginástica: um verdadeiro educador que, à sua competência esportiva, devia reunir profundo conhecimento das leis da higiene e de tudo o que a ciência médica grega elaborara quanto a observações e prescrições relativas ao desenvolvimento do corpo, os efeitos dos diversos exercícios, os regimes convenientes aos diversos temperamentos (p. 196)

Como se dava a remuneração desse educador? [...] “ali onde o pedótriba não recebia um ordenado mensal, como nas escola públicas de Teos e Mileto, os pais pagavam-lhe a empreitada do curso inteiro de educação física: esta quantia, por volta de 320 antes de cristo, era da ordem de cem dracmas. (p.197) Portanto, o “professor de educação física” na Grécia helenística era funcionário do Estado ou particular, dependendo da cidade.

Mas como é o ambiente onde este exercia suas atividades profissionais?

Quanto à escola em si, encontramo-la ora designada pelo nome de palestra, ora pelo de ginásio. As duas palavras não eram certamente sinônimas, mas o uso helenístico mistura-lhes as diversas acepções de maneira tão inextricável que a erudição moderna renúncia a fazer clara a distinção [...]. Opõe-se, às vezes, mas nem sempre, a palestra, escola para crianças, ao ginásio, onde se exercitam efebos ou adultos; ou ainda a palestra, escola privada, ao ginásio, instituição municipal. (p. 202)

Esse problema de definição complica um pouco a distinção do local de trabalho do “professor”, Marrou opta pela seguinte definição: [...] “o ginásio seria o conjunto formado pela reunião da palestra, campo de exercício cercado de edificações diversas, e do estádio, pista para a corrida a pé.” (203)

A educação física por muito tempo foi valorizada pela sociedade grega. O “professor” de educação física era um profissional especializado como nos dias de hoje; mas o espaço em que ocorriam essa educação (ginásio) era distinto das outras educações (artística e lingüística), diferenciando-se dos dias de hoje onde estas ocorrem na mesma instituição, a escola.

Esse educador é funcionário do Estado ou particular dependendo da cidade onde ele atue. O texto não trás elementos a esse respeito, mas suponho que naquelas cidades onde ele á um profissional particular ele tenha de “conquistar” alunos, competindo com outros. A remuneração parece baixa (100 dracmas em 320 a.C.) situação que deve ter se agravado por um período, a medida que a educação física foi perdendo “terreno” na sociedade grega.

MARROU, Henri-Irénée. A educação física. In: _____. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 185-210.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

INSTITUIÇÕES EDUCATIVAS


http://br.freepik.com/fotos-gratis/grecia-antiga-1_342059.htm

O presente texto não contribui muito para compreender a condição de trabalho dos “professores”. Vamos nos ater na estrutura do sistema educacional e nas magistraturas, elementos que ao meu ver são relevantes para compreendermos a condição dos “professores”.

Como é concebida a trajetória educativa?

Sob sua mais completa forma, a educação helenística supõe um conjunto complexo de estudos, que vai dos sete aos dezenove ou vinte anos. Apoiar-me-ei, para preci­sar-lhe os estágios, na velha divisão de Hipócrates (sem ser enganado pelo seu rigor simétrico: sabe-se quanto a Antigüidade, de Pitágoras às alegorias bíblicas dos Pa­dres da Igreja, se comprouve em especular sôbre os núme­ros). Hipócrates, diz-se, dividia a vida humana em oito períodos de sete anos: a educação clássica reclamava para si os três primeiros, designados pelos nomes de [...] "criancinha" (abaixo de sete anos) [...] "criança" (de sete a catorze anos), e [...] "adolescente" (de ca­torze a vinte e um). (p. 164)

Como é o “caminho a se percorrer”?

Até os sete anos, a criança permanece com sua fa­mília, sob os cuidados das mulheres; os antigos, tão preocupados com a finalidade humana da educação (a criança como tal não lhes interessa), quase não se ocupam com essa primeira fase, que para êles não faz parte ainda da Paidéia no sentido pleno da palavra. A partir dos sete anos, e teoricamente até os catorze (Aristóteles diz mais vagamente até à puberdade, [...] estende-se o período escolar: mais ou menos equivalente ao nosso curso primário. O período seguinte culmina de certo modo com um estágio de formação cívica e militar, a efebia. (p. 165)

Em que consiste a efebia? “Ela corresponde, então, exatamente ao serviço mi­litar obrigatório, tal como foi organizado em nossos Es­tados modernos.” (p. 169) A concepção a respeito da efebia logo teve que mudar:

Mas que trágica ironia! Atenas organiza meticulo­samente o recrutamento de sua armada nacional no momento preciso em que a vitória de Filipe e a hegemonia macedônica acabavam de pôr fim à independência helê­nica, ao regime da cidade livre. Como acontece tão freqüentemente à história das instituições, a da efebia só foi definitivamente regulamentada na data em que, praticamente, cessou de ter sua razão de ser. (p. 170)

As magistraturas efébicas

A integração da efebia no quadro oficial da cidade, que se explica pelas próprias origens da instituição, traduz-se concretamente pela. existência de magistrados incumbidos do contrôle, da sobrevivência e da direção efetiva do colégio. De tôdas essas funções, a mais geralmente representada é a que leva o nome característico de "chefe do ginásio" [...]: é sempre confiada a um personagem muito considerado, às vêzes "o pri­meiro da cidade", escolhido, ver-se-á logo por que, entre os mais influentes cidadãos e sobretudo os mais ricos. (p. 176)

Esse “chefe do ginásio” é denominado ginasiarca, a atividade exercida por ele corresponde a de diretor de escola de nosso tempo e tem, como podemos ver auxiliares

Esta alta personagem é ajudada em sua tarefa por um adjunto, o hipo (ou, mais raramente, o anti) gina­siarca. Em Atenas vê-se igualmente introduzir-se ao lado do cosmeta um, às vêzes dois sub (ou anti) cosmetas; no quarto século, a administração efébica é, além disso, assegurada por uma comissão de "controladores da sabedo­ria" [...] em número de dez, eleitos à razão de um por tribo; desaparecida em uma data incerta no decor­rer do período helenístico, essa comissão reaparece no Im­pério: é composta então por seis sofronístas duplicados em outros tantos sub-sofronistas. Nas cidades populo­sas ou bem organizadas, os ginásios multiplicam-se, es­pecializando-se por classes de idade, e a função desdo­bra-se: acima dos ginasiarcas encarregados de cada esta­belecimento, um ginasiarca geral controla o conjunto de todos os da cidade (p. 177)

Essa comissão de “controladores do saber” pode ser comparada aos nossos conselhos de educação. Não podemos confundir o ginasiarca com o professor

[...] não é êle quem se ocupa da instrução dos efebos, da qual é encarregado um prático, o pedótriba em Atenas, [...]. Muitas vêzes um oficial, que lhe é normalmente subordinado, assume o comando direto da tropa dos jovens conscritos: é o "chefe dos efebos" [...] escolhido às vêzes entre os próprios efebos. O ginasiarca é, pois, uma espécie de diretor geral, ou melhor, de controlador, de inspetor da efebia. (p. 177)
   
Aqui encontramos a “administração escolar”. O ginasiarca corresponde ao diretor com seu vice (sub-ginasiarca). Também há o ginasiarca geral que corresponde de certa forma, ao secretário de educação. Há a comissão de “controladores de sabedoria” para corresponder aos nossos conselhos de educação. O professor aqui é chamado de pedótriba.

O mais interessante nisso tudo é que essas personagens se tratam de cidadãos, são homens públicos que se empenham em prol da educação, não são os “professores”.

MORROU, Henri-Irénée. Instituições educativas. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 164-184.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

A CIVILIZAÇÃO DA PAIDÉIA


www.educ.fc.ul.pt

Com a ocupação por Alexandre, o Grande, e posteriormente pelo Império Romano a dinâmica da civilização grega sofrerá algumas alterações sendo uma das mais importantes a mudança referente a governança, onde [...] “a cidade é apenas a pequena pátria; não é mais a categoria fundamental, a norma suprema do pensamento e da cultura.” (p. 157). Esse povo não é mais autônomo,  é governado por estrangeiros.

Além de serem governados por estrangeiros, muitos gregos acabam por ir viver em outras terras, porém se esforça por manter-se como gregos legítimos, e para isso:

Por toda parte onde aparecem e se instalam gregos, [...] vemo-los logo implantar as suas instituições, seus estabelecimentos de ensino, escolas primárias e ginásios. É que a educação tem para eles uma importância primordial: isolados nessa terra estrangeira, querem antes de tudo, apesar da influência do meio, conservar para seus filhos o caráter de helenos ao qual se apegam acima de tudo; a educação clássica é essencialmente uma iniciação à vida grega que modela a criança e o adolescente em função dos costumes nacionais e submete-os ao estilo de vida característico que distingue o homem do bruto, o heleno do bárbaro. (p. 160)

MARROU, Henri-Irinée. A civilização da paidéia. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 153-163.

terça-feira, 23 de abril de 2013

OS MESTRES DA TRADIÇÃO CLÁSSICA II: ISÓCRATES


digital-gaffiot.sourceforge.net 

Esse educador teve um importante papel na educação de toda a antiguidade:

De Cícero a nossos dias (Burnet, Barker, Drerup, Burk, G. Mathieu...) não faltaram, a Isócrates, apolo­gistas: outorgou-se-lhe, convictamente, o título de "Pai do humanismo" - o que, na minha opinião, não deixa de ser excessivo, uma vez que se pode desejar uma definição mais profunda e mais ampla de humanismo, aplicável a algo menos acadêmico e menos escolar, a algo mais viril e mais rigoroso que êste flácido aticismo, florido sem dúvida, mas um tanto enfezado. Pelo menos, é certo - e eis aqui, já, um belo título de glória – que Isócrates foi o mestre por excelência desta cultura ora­tória, desta educação literária que vão impor-se, como caracteres dominantes, à tradição clássica, a despeito da tensão dialética que gera, no seio desta mesma tradição, a presença permanente da opção aberta pela crítica filo­sófica. De maneira geral, foi Isócrates, e não Platão, o educador da Grécia do quarto século, e, em seguida, do mundo helenístico e depois romano: de Isócrates saíram, "como de um cavalo de Tróia", êstes numerosos peda­gogos e êstes letrados, animados de um nobre idealismo, êstes moralistas ingênuos, amantes de belas frases, diser­tos e volúveis, aos quais a antigüidade clássica deve, em qualidades e em defeitos, tôda a essência de sua tradição cultural. (p. 130-131)

Carreira profissional

Isócrates foi, essencialmente, um professor de elo­qüência: ensinou durante cêrca de cinqüenta e cinco anos (393-338); antes de ingressar nessa carreira, havia exercido, de 403/402 a 391/390, aproximadamente, o ofí­cio de "logógrafo", isto é, redator profissional de dis­cursos judiciários; a partir de 380, desempenhou essa função paralelamente à atividade de escritor, de publi­cista, de homem Político. (p. 132)

Isócrates obteve sucesso, ascendendo social e financeiramente:

Como os pequenos Socráticos, é êle um educador profissional: abriu uma escola em Atenas ou em sua cir­cunjacência imediata, bem perto dêste ginásio do Liceu onde se instalará Aristóteles, escola aberta ao público, desprovida do caráter de seita hermética que distinguia a Academia; escola paga, onde, como entre os Sofistas, se combinava o preço de um ciclo completo de estudos com a duração de três ou quatro anos; e cuja taxa é de mil dracmas, tendo baixado os preços desde Protágoras e sendo objeto de concorrência; o que não impediu Isócrates de fazer fortuna, embora nisto fôsse êle favorecido, também, pelas dádivas munificentes com que o cumularam certos discípulos seus, como Timó­teo ou Nícocles; em 356 êle perdeu, irremissivelmente, um processo de "barganha de bens" - o que indica que êle foi incluído, pelo tribunal, no número dos 1200 mais ricos cidadãos de Atenas, aos quais incumbia, de acôrdo com a lei de Periandro, a manutenção da trierar­quía. Avalia-se, por isto, qual tenha sido o sucesso de sua escola (atribui-se-Ihe uma centena de alunos), su­cesso que, aliás, o envaidecia: assim nos fala êle dêstes estudantes que, originários dos confins do mundo grego - da Sicília ao Ponto Euxino -, arcando com grandes gastos e passando por grandes tribulações, acorrem a Atenas para ouvir-lhe as lições. (p. 135)

Seu valor educativo

Sob êsse aspecto, seu êxito foi ainda maior que o de Platão: à semelhança da Academia, e até mais pro­ficuamente do que esta, sua escola foi um centro de formação de homens políticos. Para seus alunos, Isó­crates foi um mestre, na mais plena acepção da palavra. Não devemos imaginar sua escola como um vasto esta­belecimento abarrotado de ouvintes: pode-se fàcilmente calcular, que o número de alunos presentes jamais ultrapassou o número máximo de nove e que se esta­belecia, em média, em tôrno de cinco a seis, três ou quatro dos quais em regime de dedicação plena. Por aí se avalia a atmosfera de intimidade em que se estabe­leciam as relações entre mestre e estudantes. Isócrates soube aproveitar-se disto para exercer, sôbre os discí­pulos, esta influência pessoal e profunda sem a qual não há ação pedagógica real. Neste particular, logrou sair­-se tão bem quanto Platão na Academia: êle próprio nos conta que a vida em comum, dentro de sua escola, apresentava a seus alunos tantos encantos, que êles encontravam, por vêzes, dificuldade em desligarem-se dela, ao terminarem os estudos; Timóteo ofereceu a Elêusis uma estátua de Isócrates, "para honrar não apenas sua grande inteligência, mas também o encanto de sua ami­zade. (p. 140-1)

Isócrates adota uma postura utilitarista, para ele o importante é fazer com que seus alunos alcancem o almejado sucesso político:

Isócrates podia, realmente, orgulhar-se de sua obra; uma vez chegado ao têrmo de sua carreira, êle havia, em certo sentido, realizado seu sonho: ser o educador de um nôvo corpo de políticos, dotar sua pátría ateniense das condições de que carecia para consumar a difícil 'recuperação nacional que acalentava, desde o revés de 404, na perspectiva de desempenhar o papel de grande potência, a que não queria renunciar. (p. 141)


O humanismo de Isócrates

Essa pedagogia traz as suas conseqüências:
 
Também neste ponto temos a impressão de chegar ao limiar de uma época e de um mundo nôvo: numa tão formal tomada de posição, já se exprime todo o ideal dos tempos helenisticos: a cultura como bem su­premo. .. Mais ainda: esta cultura nacional é, sem dú­vida, obra de todos os gregos, de tôda a história, de tôdas as cidades gregas; ela é, porém, a um grau eminente, obra de Atenas, "escola da Grécia", como Isócrates gosta de repetir com Tucídides. Sua ver­dadeira grandeza reside nesta superioridade que se ma­nifesta no plano cultural; dai a atitude política de Isócrates: uma Atenas à mercê dos demagogos, que se torna inimiga de seus melhores filhos, de uma elite sôbre a qual repousa sua cultura e, portanto, sua glória, uma Atenas degenerada não seria mais Atenas, não te­ria mais nada a defender, nem mereceria mais ser de­fendida. (p. 143)

Porém sua contribuição não pode ser menosprezada:

Assim, pouco a pouco, entre as mãos de Isócrates, a retórica transmuda-se em ética. Sem dúvida êle se recusa a compartilhar daquilo que acredita ser uma ilu­são dos socráticos, a saber, que a virtude se possa ensinar e que seja da ordem do conhecimento: pelo menos, está persuadido de que aplicar o pensamento a um grande tema, digno dêle, é um meio seguro de contribuir para a educação do caráter, do senso moral, da nobreza de alma: "Uma palavra verídica, conforme à lei e justa, é a imagem de uma alma boa e leal." Por esta im­perceptível extrapolação da literatura para a vida (admi­tindo-se que os hábitos morais contraídos em uma se transfiram, necessàriamente, para a outra), por todo êste idealismo simples, por esta ilimitada confiança nos podêres do verbo (estamos a mil léguas dos angustiosos problemas que debatem, a respeito da linguagem, homens como J. Paulhan e B. Parain), Isócrates aparece, real­mente, como a fonte de tôda a grande corrente do hu­manismo escolar. (p. 145)

As duas colunas do tempo

Há uma grande rivalidade entre este e Platão, porém não é possível resumir em cada um todo o conjunto da “escola” que cada um representa:

Seria extremamente interessante - mas, creio que, no estado atual de nossa documentação, isto seja, de fato, impossível - reconstituir a história, presumivelmente complexa e matizada, de suas relações. Elas passa­ram por uma evolução. Cada um dêles não tinha apenas um adversário único. Isócrates não era tôda a retórica: vimo-Io opor-se à pura sofística de um Alcídamas. Pla­tão não era tôda a filosofia: os "erísticos" que Isócrates combate talvez sejam também, ou sobretudo, os Megá­ricos ou Antistenes. Entre os chefes das duas facções foi possível estabelecerem-se aproximações e alianças, para a luta contra um mesmo inimigo: uma frente comum dos Dogmáticos contra a crítica dissolvente da escola de Mé­gara, e mesmo uma frente dos "Ideólogos" ou apóstolos da alta cultura contra o espírito estreito dos políticos realistas. (p. 142)

Aqui podemos verificar como um educador eficiente pode conseguir sucesso. Esse sucesso se mede pela capacidade deste em formar políticos de sucesso. Em nossos dias a escola de Isócrates seria comparável a uma escola que consegue fazer com que seus alunos passem na vestibular nas universidades mais importantes e competitivas do país ou de uma universidade que tem nos cargos mais importantes da nação ex-alunos seus. Mas tudo isso tem um preço e só quem pode pagar preços muito altos podem ter acesso, o que irá servir a manutenção do estatus quo.

MORROU, Henri-Irénée. Os mestres da tradição clássica: II. Isócrates. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 130-163.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

OS MESTRES DA TRADIÇÃO CLÁSSICA: I. PLATÃO


revistaparametro.wordpress.com

Ao tratar sobre a tradição clássica Marrou toma como modelos dois personagens que se destacaram: Platão, representando os filósofos e Isócrates representando os Sofistas. O próprio autor adverte que estes representantes não são uma espécie de modelos que teriam sido seguidos por todos os outros membros de suas respectivas escolas. Platão não era unânime entre os filósofos da época e nem Isócrates era unânime entre os sofistas.

Os socráticos menores

Muitos dos socráticos menores acabam por assumirem práticas dos Sofistas:

Excetuando Fédon de Elis, que é mais idoso, mais “arcaico” (sua escola é ainda uma escola filosófica do tipo jônico). Todos êles são, como os Sofistas, educadores profissionais, certamente não mais itinerantes (suas escolas instalam-se em cidades das quais tomam os nomes: Mégara, Erétria), mas sempre dispostos a pronunciar conferências de propaganda com fito de granjear freguesia [...] (104-5)

Porém, como podemos ver, essa prática parecida se dá no âmbito profissional, mas o objetivo por detrás da educação serão diferentes: “Mas o ideal em função do qual informam os seus discípulos é, como em Platão, e, evidentemente, em Sócrates, um ideal de Sabedoria [...], mais do que eficiência prática.” (p. 105) Haverá uma disputa “encarniçada” com os Sofistas.

Carreira e ideal político de Platão

Como estratégia para a execução de seu ideal político Platão funda a Academia, esta vem a render bons frutos:

Vale-se, para isto, da cooperação de seus discípulos, uma vez que a Academia não é apenas uma escola de filosofia, mas também de ciências políticas, uma fonte de conselheiros e legisladores à disposição dos soberanos ou das repúblicas. Plutarco conservou-nos a lista dos estadistas que Platão disseminou pelo mundo helênico: Dion de Siracusa, Píton de Heráclides, libertadores da Trácia; Cábrias e Fócion, os grandes estrategistas atenienses; Aristônimo, legislador de Megalópolis de Arcádia, Fórmion de Eléia, Medenemo de Pirra, Eudóxio de Cnidos, Aristóteles de Estagira; e, finalmente, Xenócrates, que foi conselheiro de Alexandre... [...] (p. 108)

A procura da verdade

A obra pedagógica de Platão ultrapassou de muito, em importância histórica, o papel propriamente político que êle lhe havia designado. Opondo-se ao pragmatismo dos Sofistas, demasiado apegados a eficácia imediata, Platão edifica todo o seu sistema educacional sôbre a noção fundamental da verdade, sôbre a conquista da verdade pela ciência racional. (p. 110)

Organização da Academia

É-nos possível verificar como se dá a prática pedagógica de Platão:

Tudo o que os Diálogos nos permitem entrever mostra-nos Platão como um partidário dos métodos ativos: seu método dialético é bem o contrário de uma doutrinação passiva. Longe de inculcar em seus discípulos o resultado, já elaborado, de seu próprio esforço, ao Sócrates pintado por Platão apraz, ao contrário, fazê-los trabalhar, fazê-los descobrir por si mesmos, de início, dificilmente, e depois, à custa de aprofundamento progressivo, o meio de superá-la. A Academia era, pois, ao mesmo tempo, uma Escola de Altos Estudos e um instituto de educação. (112)

E a organização dessa instituição:

Começamos agora a visualizar, de maneira bastante nítida, os quadros de sua organização; a Academia tem uma sólida estrutura institucional: ela não se apresenta como uma empresa comercial, mas na forma de uma confraria, de uma seita, cujos membros se acham estreitamente unidos pela amizade (sempre êste vínculo afetivo, senão passional, entre mestre e alunos). Do ponto de vista legal, ela é, como uma seita pitagórica, uma associação religiosa [...], uma confraria voltada ao culto das Musas e, após a morte do mestre, ao culto de Platão heroificado [...] (p. 112-113)

Utopia e antecipações

Platão tem algumas utopias que acabam por se concretizando no futuro, o que faz dessas utopias antecipações do que viria a acontecer:

Antes de tudo, a exigência fundamental: a educação deve – diz êle – tornar-se coisa pública; os mestres serão escolhidos pela cidade, controlados por magistrados especiais... Em sua época, êste anseio não era realizado quase senão nas cidades aristocráticas, como em Esparta; por tôda parte, alhures, a educação era livre e privada. Ora, veremos que a Grécia helenística adotaria, muito genéricamente, um regime bastante análogo àqueles que recomendam as Leis. Do mesmo modo igualmente rigoroso que êle preceitua, entre a educação dos rapazes e das môças (educação paralela, mas não co-educação: a partir dos seis anos, os dois sexos têm mestres e classes distintos), assume, nas tintas de sua pena, o exagero de um paradoxo: ela apenas reflete um fato real, qual seja a emancipação das mulheres na sociedade do quarto século, e, também nisto, antecipa as realizações da época helenística. (p. 114-115)
  
Outros aspectos a considerar         

Platão defende a educação elementar tradicional, para ele esta educação não leva a verdade, mas abre caminho para ela à medida que prepara o indivíduo para os estudos superiores.

Ele também surpreende por incluir nos estudos de sua Academia um espaço importante para as matemáticas, inclusive ele acredita que através dessa ciência é que se deveriam realizar seleções para futuros profissionais de diversas áreas. Outro ponto importante, que não descreveremos aqui, é o ciclo de estudos filosóficos constituídos por ele e aplicados na Academia.

Este capitulo não nos dá muitas pistas em relação às condições de trabalho do educador Platão: como se dava a sustentabilidade da Academia? Sou levado a crer que os discípulos contribuíam financeiramente para a manutenção desta e que daí saia o sustento de Platão.

O que há de mais relevante no que diz respeito ao trabalho docente é a compreensão que o filósofo tem a respeito da necessidade da educação ser pública e dos professores serem funcionários públicos.

MORROU, Henri-Irénée. Os mestres da tradição clássica: I. Platão. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 103-129.

domingo, 21 de abril de 2013

A CONTRIBUIÇÃO INOVADORA DA PRIMEIRA SOFISTICA


seteantigoshepta.blogspot.com

Primeiras escolas de medicina

Como já foi dito no texto que trata da pederastia as escolas vão se constituindo no sistema educacional predominante, chegando a constituir escolas de medicina, por exemplo.

E de filosofia

E a filosofia faz o mesmo caminho

O pitagorismo, enfim, realiza esta ambição pedagógica numa instituição apropriada: a escola filosófica. Esta, tal como aparece em Metaponte ou em Crotona, não é mais uma simples hetaria do tipo antigo, ligando mestre e discípulos no âmbito de relações pessoais; é uma verdadeira escola, que absorve o homem por inteiro e lhe impõe um estilo de vida; é uma instituição organizada, com sua sede, suas leis, suas reuniões regulares, que toma a forma de uma confraria religiosa consagrada as Musas e, depois da morte de seu fundador, ao culto de Pitágoras heroificado. Instituição característica, será mais tarde imitada pela Academia de Platão, pelo Liceu de Aristóteles, pela escola de Epicuro, e permanecerá como a forma típica da escola grega. (p. 82)

O novo ideal político

Os Sofistas criam suas escolas com o objetivo de concretizar seu ideal político: [...] “equipar o espírito do cidadão para a carreira de homem de Estado, formar a personalidade do futuro dirigente da cidade – tal é o programa que êles concebem.” (p. 83)

Os sofistas como educadores

Qual a origem desses educadores? A esse respeito o autor nos diz: “de origem diversa, itinerantes por exigências profissionais, todos estagiaram em Atenas, por maior ou menor lapso de tempo: com êles Atenas se converte no crisol em que se elabora a cultura grega.” (p. 84-5) O fato de todos estagiarem em Atenas nos dá a idéia da importância dessa cidade para a educação de toda a Grécia.

Esses profissionais não têm muitas características comuns do ponto de vista teórico, é do ponto de vista profissional que há coisas em comum e a principal é que eles encaram seu trabalho como um negócio, um comércio:

De resto, era êsse o único traço que possuíam em comum: incertas e diversas, suas idéias são demasiado fugazes para poder-se ligá-los a uma determinada escola, no sentido filosófico da palavra; êles têm, em comum, apenas seu ofício de professores. Saudamos êsses grandes antepassados, os primeiros professores de ensino superior, quando a Grécia conhecia apenas treinadores esportivos, mestres de artesanato e, no plano escolar, humildes mestres-escolas. A respeito dos sarcasmos dos Socráticos, impregnados de preconceitos consevantistas, reverencio nêles, em primeiro lugar, a condição de homens de negócio, para os quais o ensino é uma profissão cujo êxito comercial lhe atesta o valor intrínseco e a eficácia social. (p. 85-6)  

O ofício de professor

Como se dava a remuneração desses professores?

É, pois, interessante conhecer, com alguma precisão, a maneira pela qual êles exerceram seu ofício. Não abriram escolas, no sentido institucional dessa palavra; seu método, ainda bastante próximo daquele das origens, pode-se definir como um preceptor coletivo. Agrupam êles, em torno de si, os jovens que lhe são confiados e de cuja formação completa se incumbem; esta requer, ao que se impõem, três ou quatro anos. Tal serviço é prestado contra remuneração: Protágoras pedia a considerável quantia de dez mil dracmas (a dracma, [...] representa o salário diário de operário qualificado). Seu exemplo servirá por muito tempo de modêlo, mas os preços abaixarão rapidamente: no século seguinte (entre 393 e 338). Isócrates não pedirá mais de mil dracmas e lamentará que concorrentes desleais aceitem receber a bagatela de quatrocentas ou mesmo trezentas dracmas. (p. 86)

Quem foi o percursor desse modo de ensino? “Protágoras foi o primeiro a propor um ensino dêste tipo comercializado: não havia, antes dêle, semelhante instituição” [...]. (p. 86)

Quais foram às dificuldades no início? [...] “Sofistas não encontraram, pois, uma clientela já feita: foi-lhes necessário grangeá-la, persuadir o público a recorrer a seus serviços, o que explica tôda uma série de expedientes publicitários.” (p. 86)

Que métodos eram utilizados para conquistar essa clientela?

[...] “o Sofista vai de cidade em cidade à cata de alunos, levando atrás de si aquêles que já arrebanhou. Para fazerem-se conhecer, para manifestarem a excelência de seu ensino e darem mostras de sua habilidade, os Sofistas oferecem de grado uma exibição [...], seja na cidade aonde seu itinerário os conduz, seja num santuário pan-helenico como Olímpia, onde se aproveitam [...] do público internacional que aí se acha reunido por ocasião doa jogos: a mostra pode ser um discurso cuidadosamente excogitado ou, ao contrário, um brilhante improviso sôbre qualquer assunto proposto, uma discussão livremente encetada de omni re scibili, ao gosto do público. Com isso, inauguram êles o gênero literário da conferência, desde a Antiguidade fadado a tão espantoso sucesso. (p. 86-7)

A técnica política

O que norteia o ensino dos Sofistas e o que motiva a crítica dos filósofos é que [...] “êles não ensinam a seus alunos nenhuma verdade sôbre o ser ou sôbre o homem, mas tão somente a terem sempre razão, em qualquer circunstância.” (p. 89) A intenção dos Sofistas é formar homens que sejam capazes de ter sucesso na vida política. Para tanto davam ênfase a dialética, a retórica e a cultura geral.

A reação socrática

Sócrates critica fortemente os Sofistas, essa crítica se dá em virtude do extremo utilitarismo desses.

A inteligência contra o esporte

Os Sofistas são severamente contra os esportes, para eles apenas o conhecimento intelectual tem valor.

É aqui que o educador, enquanto profissional, aparece. Os Sofistas seriam o que chamamos hoje de profissionais liberais, “correm atrás” da sua clientela oferecendo seus serviços aos que poderem e quiserem pagar. A situação não parece fácil, nos primeiros tempos há a dificuldade de vender um serviço que não é conhecido e que sofre de preconceito, num segundo momento esse modelo de ensino se torna preponderante (o que deve ter gerados bons resultados financeiros para esses profissionais), mas esses bons resultados levam a um crescimento do número de interessados nessa profissão. O crescimento no número de profissionais em relação a uma demanda que já estabilizou acarretará na queda dos preços praticados o que voltará a colocar esses profissionais na berlinda. Também podemos verificar que estes se utilizam de técnicas para convencer o público da importância e vantagens de seus serviços (as conferências).

O cidadão grego aspirava ao sucesso na vida política e os Sofistas prometiam dar a estes a condição de alcançar esse sucesso. Para tanto prestam uma educação uma educação técnica (dialética, retórica, etc).

O ponto mais importante é que estes são na educação grega os primeiros profissionais da educação.

MORROU, Henri-Irénée. A contribuição inovadora da primeira sofistica. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 81-102.

sábado, 20 de abril de 2013

A ANTIGA EDUCAÇÃO ATENIENSE


http://jfmnalfandega.blogspot.com.br/

A educação não mais militar
           
A partir do século 6 a.C. a vida ateniense passa por transformações, há estabilidade política. Paulatinamente a vida militar dá lugar a civil e, por conseqüência, a educação perde o seu caráter militar.

A democratização da tradição aristocrática

A educação é privilégio das elites e esta tem por finalidade tornar as pessoas nobres. Ser nobre é ser cavalheiro. Personagens históricos e/ou fictícios são tomados como modelos, nesse tocante a obra homérica tem um papel importantíssimo.

Aparecimento da escola

O surgimento da escola é vista com desprezo pela aristocracia, esse desprezo advém do fato se um grande número de famílias emergirem socialmente, o que deixava a velha aristocracia incomodada. Essa classe emergente quer educar seus filhos, torná-los nobres. Para suprir essa demanda é necessário um método educativo diferente do tradicional.

Uma tal educação, que interessa a um número sempre maior de crianças, o ensino individual de um preceptor, ou de um amante, não podia mais bastar. Impunha-se uma ação coletiva e, segundo imagino, foi a pressão dessa necessidade social que fêz nascer a instituição da escola. A educação particular não desaparecerá de repente: como se vê por Aristóteles e Quintiliano, os pedagogos discutirão ainda, por longo tempo, sôbre as vantagens e inconvenientes de um e de outro sistema; todavia, uma vez criada, a educação coletiva não tarda a tornar-se a mais comumente difundida. Já Aristófanes, evocando a “antiga educação” – a da gloriosa geração dos maratonômacos (adultos em 490) -, mostra-nos as crianças do bairro, ao raiar do dia e sob qualquer tempo, dirigindo-se “à casa de seus mestres” (p. 72-3)

Educação física

A educação física tinha uma grande importância no período arcaico pelo fato de contribuir para o treinamento dos soldados. No período clássico a educação física continua tendo uma grande importância por motivos estéticos, a busca do corpo ideal.

Artes

As artes ganharam muito em importância na sociedade e por conseqüência na educação: educação musical, educação pela poesia e a educação literária.

Aqui a figura do educador profissional aparece, trata-se de um profissional que coloca seu trabalho a disposição de toda e qualquer pessoa que queira e possa pagar pelos seus serviços.

MORROU, Henri-Irénée. A antiga educação ateniense. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 66-80.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

DA PEDERASTIA COMO EDUCAÇÃO


http://www.kbrdigital.com.br/blog/?attachment_id=3664

O amor grego, companheirismo guerreiro

Eis aí uma temática que nos chama atenção. Em nossa época a figura do guerreiro é freqüentemente associada a do homem heterossexual que age de maneira bruta e incessível com os outros. Essa figura não pode demonstrar nenhum tipo de afeto, principalmente com relação a outro homem. É de conhecimento geral a visão preconceituosa em relação ao homossexualismo. A primeira coisa a ser esclarecida é que a pederastia na antiguidade grega não corresponde integralmente ao homossexualismo de nossos tempos, não se trata de sinônimos. A relação pederástica tinha um papel pedagógico, não durava para toda a vida e não desobrigava de contrair matrimônio. A pederastia tinha como principal finalidade educar heróis, heróis na visão homérica, capazes de cumprir seus deveres civis e militares de forma cavalheiresca. Tudo isso não significa que essas relações fossem desprovidas de sentimentos: o afeto, o companheirismo tinham um papel importante, afinal era através disso que o jovem se ligava ao mais velho e, por conseqüência, as lições por este ensinadas.

A moral pederástica

Como já se disse a pederastia não se limitava a uma relação carnal, mais do que isso, era através dela que se dava a moralização.

Inicialmente, o amor grego contribuiu para dar sua forma ao ideal moral que se arroga tôda a prática da educação helênica, ideal cuja análise comecei a propó­sito de Homero: o desejo, no mais velho, de afirmar-se aos olhos de seu amado, de brilhar diante dêle, e o desejo simétrico, no mais môço, de mostrar-se digno de seu amante, só lograram reforçar, num e noutro, êste amor da glória que todo espírito agonístico exaltava por tôda parte: a ligação amorosa é o terreno de escolha em que se depara uma generosa emulação. Por outro lado, é tôda a ética cavalheiresca, fundada sôbre o sentimento de honra, que reflete o ideal de um companheirismo de combate. A tradição antiga é unânime em ligar a prá­tica da pederastia à bravura e à coragem. (p. 55)
           
O amor viril, método de pedagogia

Nesse contexto educativo o educador (erasto) tem que se apresentar como um modelo para o seu educando (erômeno) a fim de que este deseje se igualar ao primeiro.

A relação passional, o amor (que Sócrates já distingue do desejo sexual e a êle opõe) implica o desejo de assomar a uma perfeição superior, a um valor ideal, [...]. Não me refiro ao efeito nobilitante que pode exercer sôbre o mais velho, sôbre o erasto, o sentimento de ser admirado: o aspecto educativo da ligação amo­rosa concerne, evidentemente, sobretudo ao parceiro mais jovem, ao erômeno adolescente. (p. 57)
           
Tudo isso para que se projete a imagem de que o “mais velho é o herói, o tipo superior pelo qual é preciso modelar-se, a cuja altura procurará o outro, pouco a pouco, alçar-se.” (p. 57) Assim como no mais moço surgia um sentimento de admiração o mais velho passava nutrir um certo sentimento de paternidade:

no mais velho desenvolvia-se um sentimento com­plementar: a teoria socrática é ilustrada, à luz da tra­dição, por uma copiosa série de anedotas simbólicas; respondendo a êsse apêlo, o mais velho sentia nascer em si uma vocação pedagógica, fazia-se mestre de seu amado, apoiando-se sôbre esta nobre necessidade de emula­ção. Descreve-se freqüentemente o Eros grego como uma simples aspiração da alma, inflamada de desejo, para aquilo que lhe falta; da parte do amante, o amor arcaico participa, entretanto, também, [...], por esta von­tade de enobrecimento, de dom de si, por êste matiz, para dizer tudo, de paternidade espiritual. É este senti­mento, tão minuciosamente analisado por Platão, acla­ra-se à luz de uma análise freudiana: é, evidentemente o instinto normal da procriação, o desejo apaixonado de perpetuar-se num ser semelhante a si que, frustrado pela Inversão, se inclina e se manifesta sôbre êste plano pe­dagógico. A educação do mais velho aparece como um substitutivo, um Ersotz esdrúxulo do parto: "O objeto do amor (do amor pederástico) é procriar e dar a luz dentro do Belo. (p. 57-58)

Esse processo, estranho para nós, era comum na Grécia antiga como nos relata Morrou em um comentário cheio de preconceitos: “Se me pus a desdobrar ao leitor uma análise tão paciente destas monstruosas aberrações, deve-se isto ao fato de tal ter sido, para um grego, modo normal, a técnica-padrão de tôda educação” [...] (p. 58)

Mas e a família, tinha alguma participação?

A família não podia constituir o plano da educação: a mulher, apagada, só é julgada competente para a cria­ção do bebê; a partir dos sete anos a criança lhe é reti­rada. Quanto ao pai (não devemos esquecê-Io: estamos na origem de um meio aristocrático), é monopolizado pela vida pública: êle é cidadão, homem político, antes de ser chefe de família. Releiamos, a propósito disto, o curioso testemunho que oferece Platão no início do Laques: mostra-nos êle dois pais de família vindo con­sultar Sócrates a respeito da educação de seus filhos; a dêles fôra lamentàvelmente negligenciada: "Censuramos nossos pais, que nos deixaram sem freio em nossa ju­ventude, por estarem ocupados com os místeres dos outros." Trata-se do grande Aristides e de Tucídides, o filho de Melésias, que foi o líder aristocrático oposto a Péricles e a quem o povo de Atenas fulminou com o ostracismo em 443. Tampouco podemos admirar-nos de que o mesmo Platão declare, alhures, com ênfase: a ligação pederástica estabelece, no par de amantes, "uma comunhão muito mais estreita" [...] do que a que une os pais aos filhos. (p. 58)

E a escola?

A educação não era tampouco assegurada pela es­cola: na época arcaica, esta não existia; e, depois de criada, permaneceu um pouco desprezada, desqualificada, porque o mestre era pago pelo seu serviço, restringida a um papel técnico de instrução, não de educação. (p. 58-9)

A educação nobre no final do século VI

Êste traço é tanto mais acentuado quanto a educa­ção grega clássica conserva alguma coisa da herança da aristocracia arcaica. Ela havia sido elaborada, originariamente, em função das necessidades de um meio rico, vivendo nobremente, livre de qualquer preocupação de equipar tecnicamente a juventude com vistas a um ofício, a um ganha-pão. Além do que, a educação era, preci­puamente, de ordem moral: formação do caráter, da personalidade, cumprindo-se no quadro da vida elegante, esportiva e mundana ao mesmo tempo, sobe a direção de um mais velho, dentro de uma amizade viril. (p. 59-60)­

Suas sobrevivências: relações entre mestre e aluno

Podemos verificar que nessa forma de educação é o mestre que escolhe o se pupilo e que aquele mestre que “vende” o seu saber para quem o quiser é desprezado

Durante muito tempo, a inexistência de instituições propriamente educativas fêz com que um só tipo de educação aprofundada pudesse existir: o que assim ligava o discípulo ao mestre que o distinguira chamando-o a si, que o escolhera. Salientemos o sentido em que se exercia a vocação: é um apêlo dirigido pelo mestre, do alto, àquele a quem êle julga digno disto. Por muito tempo, a opinião pública antiga desprezará o professor que faz comércio, oferecendo seu saber ao primeiro com­prador: a comunicação da ciência deve ser reservada a quem a merece. Havia nisso um senso profundo da eminente dignidade da cultura, de seu necessário eso­terismo: senso que hoje perdemos no Ocidente, embora subsista nas sabedorias orientais, a começar pela do Islã, onde se conserva bem viva a idéia platônica da superioridade do ensino oral sôbre o escrito, que é im­pessoal. (p 61)

Outra característica que nos chama a atenção é a que está expressa nas últimas frases da citação anterior “a educação a quem a merece”, concebia-se que apenas os nobres cidadãos mereciam educação.

E os filósofos?

Entre os filósofos, bastaria evocar a lembrança de Sócrates, que atraía e retinha a fina flor da juventude dourada de Atenas, pelo "visco" da paixão amorosa, apresentando-se como perito em coisas do eros. Mas seu exemplo não aparece isolado: Platão foi amante ­e, ao que consta, não apenas "platônico" - de Aléxis ou de Díon; a sucessão dos escolarcas de sua Academia fêz-se, durante três gerações, de amante para amado, porque Xenócrates foi amante de Pólemon, e Pólemon o foi de Crates, como Crântor o foi de Arcesilau. E isto não era exclusividade dos platônicos: Aristóteles foi amante de seu aluno Hérmias, tirano de Atárnea, ao qual imortalizaria com um hino célebre -, nem úni­camente dos filósofos, porque relações análogas uniam os poetas, os artistas e os sábios: Euripedes foi amante de Agaton o trágico, Fidias o foi de seu aluno Agorá­crito de Paros, o médico Teomedonte do astrônomo Eu­doxo de Cnidos. (p. 61-62)

Então, como podemos verificar, os filósofos eram pederastas. Os educadores que não eram pederastas eram os sofistas.

Safo educadora

A educação feminina também tinha o seu espaço.

Permitem-nos êles entrever que, em Lesbos, ali pelos fins do sétimo século, as jovens podiam receber um com­plemento de educação, entre o tempo da infância, pas­sado em casa sob a autoridade da mãe, e o do casamento. Essa educação superior cumpria-se numa vida comuni­tária no seio de uma escola - a "morada das discípulas das Musas" -, que se apresenta, juridicamente, sob a forma (que será também, a partir de Pitágoras, a das escolas filosóficas) de uma Confraria religiosa [...] dedicada às deusas da cultura. Ali, sob a direção de uma mestra, cujo tipo Safo gravou no retrato que pinta de si mesma, sua jovem personalidade configura-se num ideal do belo, aspirando à Sabedoria. Tecnicamente, essa escola equivale a um "Conservatório de Música e Declamação": pratica-se aí a dança coletiva, herdada da tradição minóica, a música instrumental, e, sobretudo, a nobre lira, assim como o canto. A vida comunitária é ritmada por tôda uma série de festas, ceri­mônias religiosas ou banquetes. (p. 62-63)

Nessas escolas também eram palco de relações amorosas entre mestra e discípulas

Enfim - e aqui reencontramos o tema do presente capitulo -, também esta educação não deixa de ter sua chama passional, pois entre mestra e discípula aperta­-se o elo ardente de Eros. Na verdade, é isto o que sabemos melhor a seu respeito, pois, em última análise, só percebemos tôda esta pedagogia através do eco das paixões experimentadas pelo coração de Safo, através dos gritos lancinantes que a dor lhe arranca quando ela é apartada, pelo casamento ou pela traição, de alguma de suas alunas e amadas. O amor sáfico não recebeu ainda, aqui, a transposição metafisica que receberá, em Platão, a pederastia, convertida numa aspiração da alma à Idéia: é ainda, apenas, uma paixão humana, ardente e frenética: "Eros de nôvo, êste quebra-ossos, atormen­ta-me, Eros amargo e doce, a invencível criatura, oh minha Átis! E tu, enfastiada de mim, foges para An­drômeda." (p. 63-64)

E pelo que podemos verificar havia escolas para moças concorrendo entre si

Só conhecemos a tíase lesbiano por um acaso aquêle mesmo que dotou de gênio a alma ardente de Safo: mas seu exemplo não parece isolado: sabemos que ela teve, em sua época, algumas concorrentes, rivais no plano profissional: Máximo de Tiro conservou-nos o nome de duas destas ‘diretoras de pensionatos para senhoritas’, Andrômeda e Gorgona. O ensino feminino, por muito tempo ofuscado – ao menos em nossa documentação – em virtude da predominância masculina na civilização grega, só torna a aparecer novamente às claras muito mais tarde, pouco antes de abrir-se a época helenística. (p. 64)

A pederastia era o método educativo utilizado pelos nobres. O Educador, o erasto, escolhia um jovem a quem se dedicava educar. Num primeiro momento não existem educadores profissionais e quando este começam a aparecer há um descrédito para com eles, exatamente por cobrarem. E, por último, a educação das moças se dá em instituições específicas (confrarias), o texto nos leva a supor que havia alguma forma de pagamento para a manutenção desta, mas não há registro de como e quanto isso representava.

MORROU, Henri-Irénée. Da pederastia como educação. In: ___. História da educação na antiguidade. São Paulo: EPU, 1975. p. 51-65.