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domingo, 1 de setembro de 2013

A EDUCAÇÃO NA BAIXA IDADE MÉDIA


http://gloriadaidademedia.blogspot.com.br/2009/10/nos-mosteiros-escolas-gratuitas-para.html

O clero deixará a função de ensino para um “profissional” especifico

Quanto às escolas do clero secular, originariamente o mestre era o bispo (ou, nas paróquias, o pároco), mas logo esta tarefa foi por Ees transferida para um scholasticus ou magischola. Este foi um cargo cuja dignidade cresceu com o tempo, tanto que o magischola acabou assumin­do na Igreja funções mais elevadas, transmitindo, através de uma espécie de investidura, a função de ensinar a um seu substituto, o proscholus. (p. 142)

O “mercantilismo educacional” parecia ter desaparecido, porém, ele volta a dar as caras na sociedade:

Foi, de fato, um fenômeno característico desta época feudal a difu­são do costume de o magischola vender a autorização de ensinar, a licentia docendi, e, conseqüentemente, o costume de cobrar o ensina­mento dado aos alunos por parte de quem tinha conseguido essa licença: dois casos, em certo sentido, de "simonia". A ciência é dom de Deus, portanto, não pode ser vendida, dirão insignes doutores e as bulas pon­tifícias repetirão: o saber, de fato, embora fundado nas artes liberais, consistia na doutrina cristã e culminava na teologia. Apesar disso, era vendido. Investiduras e simonias: esta é a escola de uma sociedade e de uma Igreja feudais, ainda que a venda da ciência já prenuncie o surgir de uma sociedade laica de tipo novo. (p. 142)

A Igreja se afirma de vez na condição de detentora dos direitos sobre a educação:

A crise do império carolíngio levara a uma nova situação: a fonte, agora imperial, do direito escolar passara de fato à Igreja, como também passa para da o controle político, anteriormente do império, sobre as escolas eclesiásticas. Além disso, a Igreja foi abrindo suas escolas epis­copais e paroquiais também aos leigos, dando-Ihes ao mesmo tempo instrução religiosa e literária. Criou-se, em suma, um monopólio eclesiás­tico da instrução que, apesar das reações por parte da autoridade polí­tica, derrubou a situação que se criou no império carolíngio e provocaránovos choques. Convém, portanto, seguir o esforço da Igreja para reorga­nizar suas escolas e controlar as outras, seguindo- e inovando a tradição de Eugênio II e de Leão IV, cujas disposições serão sempre retomadas e inscritas nos cânones sagrados. (p. 143)
"a ninguém, feitos os votos ou feita a profissão religiosa em qual­quer mosteiro, era permitido sair para ensinar ciências naturais ou leis mundanas" (G.M., l, 193-194). (p. 143)

Há uma crise entre a Igreja com a educação realizada pelos sacerdotes e aqueles que vendiam o seu ensino

Em 1179, exatamente cem anos após Gregórlo VII, um outro papa, Alexandre III, ao reafirmar novamente esta obrigação, inovava corajo­samente as decisões de Lotário e dos bispos franceses do século IX, im­pondo não somente às igrejas como também aos mosteiros a obrigação de estender o ensino aos leigos pobres. Além disso, ele denunciava seve­ramente os casos de simonia escolástica, isto é, a venda da licentia docendi, e os obstáculos contra quem, munido da licença, quisesse livre­mente ensinar, e ordenava que o magischola não se permitisse impedir nenhum clérigo capacitado de ensinar aos outros, pelo menos fora dos muros da cidade, extra muros civitatis. São decisões bastante significa­tivas, qu!'" libertam os mestres de qualquer submissão feudal e qualquer suborno simoníaco. Leiam-se textualmente as palavras do Concílio La­teranense, convocado por Alexandre III em 1179:
"Cada Igreja Catedral crie um benefício para um mestre, que ensine gratuitamente aos clérigos da mesma Igreja e aos demais pobres. . . A Igreja, como piedosa mãe, tem a obrigação de prover os pobres, que não podem ter o apoio dos pais, para que não sejam privados da oportunidade de ler e progredir no estudo. .. .
Esta escola seja também instituída nas demais igrejas e nos mos­teiros. . .
Para a licença de ensinar não se exigia nenhum pagamento; nem, sob o pretexto de costume, alguém peça remuneração a quem está ensinando ou impeça ensinar a quem está idôneo e devidamente licenciado. . .
Aquele que, de fato, pela avidez de seu espírito vende a licença, tenta impedir o progresso da Igreja" (G.M., l, 70-74) (p. 142-143)

A Igreja fecha o cerco contra aqueles que após receberem dela a autorização para ensinar passam a faze-lo por dinheiro

Trinta e seis anos depois, em 1215, o novo Concílio Lateranense, convocado pelo papa Inocêncio lU, confirma e precisa este compromis­so: dispõe que a eleição do magischola seja feita pelo bispo e seu cabido, confirma a obrigação de ensinar gratuitamente, reafirma que as escolas devem surgir nas igrejas-catedrais e nas demais igrejas e que devem estar abertas não somente aos "clérigos da mesma 'igreja", mas também "aos alunos pobres", e especifica que devem ser instruídos "na gramática e nas demais disciplinas". Portanto, não é somente a doutrina religiosa que a Igreja pretende ministrar: toda a instrução agora lhe diz respeito, superadas as dúvidas de consciência sobre a origem pagã da instrução instrumental e rejeitadas as tentações da "santa ignorância". Natural­mente, porém, o grande objetivo desta cultura fundada nas artes liberais não é mais a eloqüência política e o direito, mas a teologia. No mesmo concílio, de fato, decide-se que toda igreja metropolitana tenha um en­sino de teologia:
"Pelo menos a igreja metropolitana tenha um teólogo que instrua os sacerdotes e os outros nas sagradas escrituras e os eduque espe­cialmente em tudo aquilo que é necessário para a cura das almas" (G.M., l, 72). (p. 144)

Como podemos ver a Teologia e, por conseqüência, os profissionais especializados nela ganham em importância, mas se faz necessário algumas garantias:

Quatro anos mais tarde, em 1219, Honório lU, ao evocar o rigo­roso respeito às decisões do seu antecessor sobre o ensino de teologia, ao mesmo tempo introduz uma profunda inovação num ponto essencial, o da venalidade da ciência, ordenando que aos mestres de teologia, não obstante qualquer outro costume ou instituição contrário, seja concedido pelo bispo um ordenado, caso a renda de seus benefícios seja insuficiente, e que lhes seja garantida esta renda durante cinco anos, também no caso em que tenham deixado o ensino para se aperfeiçoarem em seus estudos.
"Queremos e ordenamos que se observe rigorosamente quanto foi estabelecido no Concílio geral sobre a nomeação dos mestres de teologia em cada igreja metropolitana; além disso, estabelecemos, com base no conselho dos bispos nossos irmãos. . ., que, podendo, pela raridade dos mestres, alguns deles esquivar-se, os prelados e os cabidos das igrejas destinem ao estudo da teologia alguns mais capazes de aprender, para que, uma vez instruídos, resplandeçam na Igreja de Deus como uma luz do céu e possamos ter, em seguida, abundância de doutores. . ." (G.M., l, 73-74). (p. 144-145)

E acrescenta:
"caso a renda de seus benefícios seja insuficiente, eles lhes desti­nem um ordenado, e se forem estudar e ensinar teologia fora de suas dioceses, continuem por cinco anos percebendo os proventos de seus benefícios, não obstante qualquer outro costume ou dispo­sição'" (ibidem). (p. 145)
           
Mas o autor não vê nessa iniciativa apenas uma preocupação com a garantia e qualidade no ensino de teologia:

o que aconteceu para que o papado interviesse, contra seus pró­prios costumes e disposições, encorajando clérigos e monges com orde­nados e com outras subvenções, que chamaríamos de bolsas de estudo, a serem usufruídos longe da própria diocese? Após a luta contra o feu­dalismo, com suas investiduras e sua simonia, estes parecem ser os sinais de uma outra luta para o desenvolvimento burguês e mercantil de um sistema educativo que a Igreja, aliada das comunas contra o império, conduz com maior ou menor consciência de sua função histórica. (p. 145)

Isso pode ser explicado pelo

surgimento da economia mercantil das cidades e à sua organização em comunas, um novo processo se introduz na instru­ção com o aparecimento dos mestres livres que, sendo clérigos ou leigos, ensinam também aos leigos. Munidos da licentia docendo concedida pelo magischola, ensinando fora das escolas episcopais e freqüentemente, para evitar concorrência, fora dos muros da cidade (extra muros civitatis), eles satisfazem as exigências culturais das novas classes sociais. A Itália parece ser o centro deste desenvolvimento. (p. 145)

O monopólio da Igreja começa a ser ameaçado seriamente

Estes mestres livres ensinavam especialmente as artes liberais do trívio e do quadrívio; mas aqui e ali aparecem também escolas livres de outras disciplinas. É provável que justamente destes mestres livres, que atuavam junto às escolas episcop!iis e sempre sob a tutela jurídica da Igreja (e também do império), tenham nascido em seguida as universi­dades. Em Salerno, já antes do ano 1000, existia uma tradição de prá­tica médica que paulatinamente assumiu o caráter de uma verdadeira escola teórica e que, dois séculos mais tarde, foi reconhecida como Stu­dium generale (isto é, cujos títulos eram reconhecidos em qualquer lugar: em suma, uma universidade). E, fato determinante, em Bolonha, na se­
gunda metade do século Xl, teve inicio o ensino do dIreIto romano por obra de Pepone, seguido no começo do século seguinte por Irnério, pelo aual se costuma comecar a história das universidades medievais. (p. 145-146)

As relações entre mestres e estudantes também mudam:

Nas relações com seus mestres, os estudantes tinham fortes poderes: de fato, eram os próprios estudantes, através de seus representantes en­carregados das collectae, que os pagavam; às vezes nem pagavam. Diz a respeito Odofredo, sucessor de Irnério em Bolonha:
"Sabeis bem que, quando os doutores fazem coletas, o doutor não pede aos escolares, mas escolhe dois deles para que sondem a von­tade dos outros; e os escolares se comprometem por intermédio deles. Mas os maus escolares não querem pagar" (G.M., 1, 230-31). (p. 149)

Mas a Igreja não saiu de cena:

Mas, à parte o apoio do poder político aos estudantes, a Igreja man­teve uma espécie de supervisão sobre as universidades através da con­cessão, com exame prévio dos títulos de estudo, da autorização para ensinar, a licentia docendi. (A conventatio era a cerimônia pública que sucedia à da concessão da licentia, interna da universidade.) Portanto, feita exceção à importante iniciativa dos mestres livres, nota-se uma continuidade ininterrupta, pelo menos na direção política, entre escolas episcopais e universidades. (p. 150)

Assim como as outras profissões se organizam em corporações, os mestres também constituíram as suas e

Neles, numerosas são as normas que regulam não somente as re­lações externas da arte ou corporação com o poder público e com o mercado [...], mas também as relações internas entre trabalhadores, que podem ser mestres, sócios, aprendizes e também diaristas assalariados. (p. 161-162)
A aceitação previa um verdadeiro contrato formal, assinado por dois probiviri da arte, como testemunhas. (p. 163)

MANACORDA, Macio Alighiero. A educação na Baixa Idade Média. In: ______. História da educação: da antiguidade aos nossos dias. 5. ed. São Paulo: Cortez, 1996. p. 140-167.

4 comentários:

  1. Respostas
    1. Caro amigo! Infelizmente, com o passar dos anos, o link abaixo da imagem não reporta mais para uma descrição da mesma. Sendo assim, desconheço a autoria. Um abraço!

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  2. Muito vago a descrição sobre os termos usados por" scholasticus ou magischola" gostaria de saber

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